Não deu tempo para Jair Bolsonaro festejar a sua liberação do leito hospitalar do Hospital Albert Einstein, pois mal aterrizou no Planalto e viu-se envolvido por inúmeras crises, as mais espinhentas oriundas de seu círculo familiar, ou melhor dito, de seus filhos. Nas eleições presidenciais do ano passado, algo de curioso aconteceu, similar às campanhas do varejo como também das companhias aéreas: “compre um e leve dois”. Nas urnas de outubro optamos por um e acabamos levando quatro.
Obviamente me refiro ao clã Bolsonaro, o presidente e seus três filhos, que atuam em bloco, solidamente unido por fortes laços emocionais e ideológicos, tendo encontrado na máxima de Alexandre Dumas em Os Três Mosqueteiros: “um por todos e todos por um” a sua definitiva norma de atuação.
Os três “garotos”, como ele continua a chamá-los, conquistaram, pelo voto popular, importantes funções na administração pública: Flávio, o primogênito, foi eleito senador pelo Rio de Janeiro; Carlos, o pitbull da família, vereador pela cidade do Rio de Janeiro; e Eduardo, deputado federal por São Paulo. Mesmo assim, a prole não arreda pé do Planalto, procurando influenciar a todo custo, a tomada de decisões palacianas e causando, não poucas vezes, constrangimentos entre os grupos que compõem o núcleo duro do governo.
Ao que parece, a proximidade ao poder lhes subiu à cabeça, pois circulam pela Presidência da República como se estivessem numa empresa privada de propriedade da família. A ala militar já pronunciou-se contra a ingerência dos “garotos” nos negócios de Estado, deixando entrever uma eventual retirada de apoio caso continuassem as descabidas intervenções em negócios que não lhes dizem respeito.
O clã Bolsonaro é um elemento fortíssimo no governo central. Ideológico e belicoso, encontra sua inspiração nas teses de extrema direita de Olavo de Carvalho, brasileiro radicado nos Estados Unidos e idolatrado pela família presidencial. A ele devemos a nomeação de excentricidades, como Ricardo Velez para o Ministério da Educação e Ernesto Araujo para o Itamaraty.
Paranoicamente convictos de que as esquerdas, PT, comunistas, TV Globo, Folha de São Paulo e a imprensa em geral ameaçam permanentemente o cargo e a vida do presidente, esta turma se mantém em permanente mobilização em um clima de agressiva campanha eleitoral.
Como contraponto, encontramos um segundo grupo na alta esfera, tão poderoso como o anterior, porém menos ideológico, mais pragmático e cauteloso, aberto ao diálogo e à negociação. Figuram neste grupo de “moderados” e o vice, general Hamilton Mourão, os ministros Paulo Guedes e Sérgio Moro e a ala militar sediada no Planalto.
É mais do que natural que grupos com visões do mundo tão antagônicas tenham desacordos frequentes, quando não permanentes.
A fritura e defenestração do ministro Gustavo Bebiano da Secretaria Geral da Presidência da República, foi um exemplo: os “moderados” queriam mantê-lo, temendo respingos que pudessem dificultar a aprovação das reformas no Congresso.
O recente encontro do “Grupo de Lima”, que reuniu chefes de governo e chanceleres americanos para confabular sobre a crise venezuelana, também não deixou de ser uma lapidar demonstração da falta de confiança reinante: os moderados conseguiram escalar o vice-presidente Mourão, para que “botasse o olho” no chanceler Ernesto Araújo, grande entusiasta de uma intervenção militar no país vizinho, entusiasticamente apregoada pelo guru americano, Donald Trump.
Em verdade, os militares estão mostrando sinais de cansaço das trambicagens dos filhos e da inabilidade política do titular. A encrenca financeira do primogênito Flávio e o triste envolvimento do filho Carlos na demissão de Bebiano só fizeram aumentar o desagrado das fardas com os filhos do capitão.
Bolsonaro terá que botar urgentemente ordem na casa, decretando o banimento de todos da Capital Federal e limitando suas presenças aos churrascos familiares nos finais de semana, na Granja do Torto.
Tenho a forte impressão de que se a governabilidade do país correr o menor risco, teremos um “golpe branco” e o atual governo militarista se transformará num governo militar. Espero estar enganado.
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